25 anos dedicados a manter o rebanho mato-grossense livre da febre aftosa – médica-veterinária Rísia Lopes Negreiros
8 de outubro de 2020 – Atualizado em 08/10/2020 – 6:49pm
Em 1995 quando o rebanho bovino de Mato Grosso beirava as 9 milhões de cabeça de gado, chegava ao estado, com a missão de contribuir com a reabertura do mercado europeu para a carne mato-grossense, a médica-veterinária mineira Rísia Lopes Negreiros.
Indicada por um professor da disciplina de Higiene e Saúde Pública da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), onde graduou-se, Dra. Rísia foi trabalhar no Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea/MT).
“Eu não enxergava essa minha vocação para trabalhar com a saúde pública veterinária, mas desde o início da disciplina este meu professor disse que eu levava jeito e depois de mais de cinco anos de formada recebi a ligação do Indea/MT me convidando para trabalhar por indicação dele”, conta a médica-veterinária.
Naquele ano o rebanho bovino de Mato Grosso ainda registrava focos de febre aftosa e o Governo pretendia erradicar a doença para voltar a exportar para o mercado europeu. Uma das estratégias adotadas foi garantir a presença de um médico-veterinário em cada unidade local do Indea/MT. “Estávamos na fase de controle, a presença dos profissionais visava aumentar a agilidade na notificação dos focos bem como a capacidade da vacinação para afastar o quanto antes a doença do estado e posteriormente responder às auditorias internacionais”, explica Dra. Rísia.
A unidade local do Indea/MT no município Figueirópolis d’Oeste, que pertencia à regional de Cáceres, foi a primeira casa da médica-veterinária, foi lá que ela recebeu a primeira auditoria nacional para entender essa dinâmica de informação entre serviços públicos internacionais. Em 1996, Dra. Rísia passou no concurso público do Estado, tornou-se servidora efetiva e foi transferida para a unidade local de Tangará da Serra, onde recebeu a auditoria internacional.
“Em janeiro de 1996 Mato Grosso registrou o último caso de febre aftosa, algum tempo após fomos auditados pela União Europeia e no segundo semestre do mesmo ano aprovaram a venda de carne maturada brasileira, o que permitiu o avanço da indústria frigorífica no estado”, lembra.
A primeira missão da médica-veterinária, contribuir para os avanços da erradicação da febre aftosa em Mato Grosso, estava cumprida.
O trabalho no campo encantava a médica-veterinária. Sedenta por fazer sempre mais, Dra. Rísia inseriu Tangará da Serra no rol de unidades informatizadas do Estado para emissão da Guia de Trânsito Animal (GTA). “Eu me sentia privilegiada com o meu trabalho, sabia que era um serviço importante e por isso, sempre dei o meu melhor”.
Os desafios do início da era digital fez com que a profissional fosse em busca de mais conhecimento. “Não achava justo eu cadastrar tantos dados e fazer os relatórios manuais. Então decidi fazer um curso de informática na agropecuária em Lavras e aprendi a fazer relatórios digitais”.
O aprendizado em informática levou Dra. Rísia ao polo do Indea/MT de Barra do Bugres responsável pela supervisão de mais 13 municípios. A passagem por lá foi rápida, uma vez que o então presidente do Instituto a convidou para a administração central em Cuiabá. Era o início de uma longa pausa entre a médica-veterinária e o trabalho de campo. “Em 1999 cheguei a Cuiabá para contribuir com utilização dos dados obtidos da informatização do Instituto, restaurava backups, extraia conteúdo dos disquetes, gerava relatórios, entre outras atividades”, recorda a profissional.
Pouco tempo depois, mais uma grata surpresa na vida da médica-veterinária, substituir o epidemiologista Dr. Getúlio Figueiredo que estava prestes a se aposentar. Ela então decidiu se aperfeiçoar e tornou-se mestre e doutora em epidemiologia pela Universidade de São Paulo com dois grandes estudos, prevalência da brucelose e análise de dados das GTA’s.
Já era o início dos anos 2000 e a pecuária mato-grossense estava em pleno crescimento. Um dos maiores desafios da época era manter Mato Grosso livre da febre aftosa. Para Dra. Rísia, isso significava garantir alimento seguro à população e o crescimento da economia do estado.
Na administração central do Indea/MT, ela trabalhou, incansavelmente, processando tudo que acontecia no campo, entregando soluções e metas sob sua responsabilidade para os profissionais que atuavam nas unidades locais. Todo o trabalho valeu a pena. Desde o ano 2000, o estado é reconhecido internacionalmente pela Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) como livre de febre aftosa com vacinação.
Os desafios não pararam. Justamente naquele ano, quando a pecuária mato-grossense crescia exponencialmente, o estado do Rio Grande do Sul registrou um caso de aftosa. “O fato serviu de alerta e me fez entender que devíamos aumentar a vigilância para não corrermos riscos de retroceder e perdermos tudo que havíamos conquistado. Fui fazer cursos para aprender como proteger o nosso território e não deixarmos a aftosa entrar novamente”.
Podia ser o bastante, mas a médica-veterinária não parou. “Era hora de cuidar das nossas fronteiras. Junto com colegas do próprio Indea e do Ministério da Agricultura montamos fiscalizações volantes e detectamos a fragilidade do território. Chegamos a conclusão de que devíamos unir com a iniciativa privada para avançar com a defesa em território Boliviano, afinal são eles os donos do negócio e nós não tínhamos nenhuma autonomia no país vizinho”.
Sem falar espanhol, Dra. Rísia foi, mais uma vez, estudar para aperfeiçoar o seu trabalho. Ela também fez questão de entender a política administrativa da Bolívia para que a interlocução entre os países fluísse da melhor forma possível. “O idioma nos aproximou e deu segurança aos bolivianos de que não estávamos enganando-os, isso foi fundamental para conseguir a contribuição do país vizinho”, lembra a profissional.
Após conquistar a confiança dos bolivianos, Dra. Rísia auxiliou os gestores à época, na busca de parcerias e, com o apoio do antigo Fundo Emergencial da Febre Aftoso (Fefa), deu início à distribuição de vacinas para os produtores da Bolívia, o que acontece até os dias atuais. A médica-veterinária também ajudou na construção da legislação de defesa sanitária, na criação do Serviço Nacional de Segurança Alimentar boliviano, da primeira sorologia e das zonas livres do país vizinho.
Hoje, Dra. Rísia caminha para o final da carreira ciente da grandeza do serviço público e da medicina veterinária. Já são 24 anos sem registro de febre aftosa no rebanho bovino que hoje é o maior do Brasil. “Eu não planejei nada disso, eu aprendi fazer, fazendo. O serviço foi a grande âncora, que me moveu e me levou”.
Depois de 20 na administração central, a médica-veterinária retornou para onde tudo começou, uma unidade local, desta vez a de Cuiabá. “Para um epidemiologista isso é um presente, é beber da fonte. Passei 20 anos ajudando a construir metas, planejando, fazendo estudo de redes, estudando prevalência de doenças, idealizando sistemas de vigilância e seus registros, fazendo relatórios e agora estou de volta ao campo, executando o que trabalhei. Isso é um prêmio. É fechar um ciclo de forma exitosa”.
Ela ainda atuou na política de classe e foi conselheira suplente no Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) até o ano de 2018, no cargo contribuiu para a elaboração do novo código de ética do médico-veterinário, que está vigente atualmente.
Fonte: Assessoria de Comunicação CRMV-MT